quinta-feira, 4 de novembro de 2021

(Ap 3.10) diz que a Igreja estará na Tribulação?


De acordo com alguns adeptos da visão escatológica denominada de Pós-Tribulacionismo, o texto contido em (Ap 3.10), é mais uma referência de que Deus manterá sua Igreja na Terra no período da Grande Tribulação. Esta ideia é fundamentada por eles com base no sentido da preposição ἐκ (Gr. ek) a qual existe no texto grego:

ὅτι ἐτήρησας τὸν λόγον τῆς ὑπομονῆς μου, κἀγώ σε τηρήσω ἐκ τῆς ὥρας τοῦ πειρασμοῦ τῆς μελλούσης ἔρχεσθαι ἐπὶ τῆς οἰκουμένης ὅλης πειράσαι τοὺς κατοικοῦντας ἐπὶ τῆς γῆς.[1].

 De acordo com o gramático, Daniel Wallace, a preposição, a qual ocorre no Texto no caso genitivo, tem os seguintes significados: para fora delonge dedesde depor causa deporpor meio de[2]. Então, com base no sentido de para fora de ou longe de, os pós-tribulacionistas entendem que o Senhor não irá livrar a Igreja da Tribulação, mas na Tribulação, ou seja, os salvos serão preservados em meio ao caos.

Todavia, não pensamos que tal interpretação seja a melhor à luz de outras passagens do Novo Testamento. Por quê?

Bem, em (Ap 3.10) temos a expressão τηρήσω ἐκ (tērēsō ek) traduzida por gardarei de. τηρήσω vem de τηρέω (tērēō). Todavia, há um detalhe que não pode ser deixado de fora. Já somos cientes que a preposição ek é de movimento ou deslocamento. Porém, quando uma preposição de movimento ocorre junto a um verbo estático, sua força é anulada. Exemplo: em (Lc 6.47) o verbo ἐρχόμενος (vir) e a preposição πρός (para) se combinam, pois ambas indicam movimento. Já em (Jo 1.1), a mesma preposição πρός, traduzida como (com), não combina com o verbo (estava), já que este é estático e a preposição transitiva. Outro exemplo interessante ocorre com a preposição de movimento de fora para dentro εἰς (eis) e o verbo estático τηρέω (tēreō) em (At 25.4), onde vemos que Paulo foi colocado e mantido provisoriamente na cadeia[3].  Aliás, a preposição εἰς poderia ter sido inserida por João, caso este quisesse indicar a entrada e a permanência provisória e/ou definitiva da Igreja na Tribulação. João ainda poderia ter feito uso da preposição ἐν (en) ou διὰ (dia), as quais têm os significados temporais: dentro de e durante[4].  Por exemplo: no Novo Testamento, en é usada pelo menos em duas ocasiões junto ao verbo tēreō indicando permanência, a saber, Pedro sendo mantido ou guardado dentro da prisão após sua introdução (At 12. 5); e a herança de Deus, da mesma maneira, guardada (dentro) no céu (1 Ped. 1: 4). João tinha conhecimento destas preposições. Mas, prossigamos à conclusão. 

Bem, aplicando a regra, a preposição ek de (Ap 3.10) tem sua força anulada pelo verbo estático tērēō. Logo, não se pode exegeticamente entender que o apóstolo prometeu aos leitores do seu livro que a Igreja será introduzida e mantida-protegida na - Tribulação. Isto é (Ap 3.10) não tem força pós-tribulacionista, sobretudo porque a ideia de preservação dos salvos dentro do caos, além de também não encaixar com a revelação bíblica dos mártires mortos em grande tribulação (Ap. 6, 7), não corrobora com os textos os quais apresentam a ira vindoura de Deus sobre os que o rejeitou, e não para a Igreja fiel, a Noiva do Cordeiro (Rm 5.9; 1Ts 1:10, 5:9).

 No amor de Cristo,

Itard Víctor



[1] ALAND, Kurt; ALAND, Barbara; KARAVIDOPOULOS, Johannes; MARTINI, Carlo M; METZGER, Bruce M. O Novo Testamento Grego. Quinta edição revisa. Edição com aparato crítico e introdução em português. Barueri: SBB, 2018.

[2] WALLACE, Daniel B. Gramática Grega, Uma Sintaxe Exegética do Novo Testamento. 1ª edição em português, 2009. P. 371. EBR

[3] Op.Cit. p. 359. 

[4] Op.Cit. p. 369, 372

 

quinta-feira, 4 de março de 2021

“Aborto” é a melhor tradução?

 




                                                                              Επίστευσα, διὸ ἐλάλησα

                                                                                    Cri, por isso falei 

 

Analisando (Ex 21:22), percebo que a expressão ( וְיָצְאוּ ), não é bem traduzida quando optam por ( aborto ). Por quê? Porque a palavra יָצָא (sair, trazer para fora, dar à luz, conforme o Halot, Holladay, Strong) é empregada no contexto de vivência, por exemplo, (Jó 1.21; Gn 25.26). Nesse caso, a expressão hebraica tem o sentido de um (nascimento prematuro, mas sem o óbito do bebê). É por isso que a punição era apenas financeira. Se o texto tratasse do aborto, ao invés do pagamento de uma taxa, o criminoso pagaria com a vida, pois esta era a sentença caso ele assassinasse a mãe (verso 23). E, para corroborar minha suposição, cito os textos os quais mostram que o feto recebe as mesmas características de um nascido e, portanto, para Deus tem o mesmo valor, o que fortalece a presente ideia de que a pena para um aborto não seria apenas financeira. (Sl 139.16, 51.4; Jr 1.5; Gl 1.15; Lc 1.44).

Por Cristo,

Itard Víctor.

 


terça-feira, 2 de março de 2021

Diferença- Pelagianismo, Semipelagianismo e Arminianismo

 


                                                                                           Επίστευσα, διὸ ἐλάλησα

                                                                           Cri, por isso falei 



Diferença- Pelagianismo, Semipelagianismo e Arminianismo?

De forma resumida e objetiva temos as seguintes definições:

Pelagianismo: Ensino o qual conclui que o homem não foi afetado pela desobediência de Adão e Eva. Com base nisto, é entendido que, o ser humano, além de não ter pecado, e poder viver sem ele, é capaz de alcançar a salvação somente pelos seus esforços, ou seja, Deus não tem qualquer participação no ato salvífico. Pelágio, monge irlandês que viveu entre os séculos (IV-V d.C), foi o defensor do que veio a se chamar Pelagianismo.

Semipelagianismo: Ensino o qual conclui que o homem foi um pouco afetado pela desobediência de Adão e Eva, porém ele ainda é capaz de dar sozinho o primeiro passo em direção à salvação. Nesse sistema, Deus continua não sendo o Agente Primário da salvação. João Cassiano, monge francês que viveu entre os séculos (IV-V d.C), foi quem primeiro defendeu o sistema semipelagiano.

Arminianismo: Ensino o qual conclui que o homem foi totalmente afetado pela desobediência de Adão e Eva (Rm 3.23) e, por isto, entende que, sem a participação primária de Deus no processo salvífico, o homem jamais pode responder ao convite à salvação, embora tenha em si o livre-arbítrio para decidir sobre outras coisas. O pecador está caído. Jacó Armínio, pastor holandês que viveu entre os séculos (XVI-XVII d.C), comentou sobre o livre-arbítrio e o estado caído em que o homem se encontra:

O livre-arbítrio é incapaz de iniciar ou aperfeiçoar qualquer bem verdadeiro e espiritual, sem a graça. Para que eu não possa ser considerado, como Pelágio, como usando de mentiras com respeito à palavra “graça”, quero dizer, com isto, aquilo que é a graça de Cristo e que diz respeito à regeneração. [...] Confesso que a mente de um homem carnal e natural é obscura e sombria, que os seus afetos são corruptos e desordenados, que a sua vontade é obstinada e desobediente, e que o próprio homem está morto em pecados.[1]

Neste estado, o livre-arbítrio do homem para o que é bom não somente está ferido, aleijado, enfermo, distorcido e enfraquecido; ele também está aprisionado, destruído, e perdido. E os seus poderes não estão somente debilitados e são inúteis (a menos que seja assistido pela graça), mas está totalmente privado de poder, exceto aqueles poderes dados pela graça divina. Pois Cristo disse: ‘sem mim nada podeis fazer’.[2]

Em suma, no Arminianismo, Deus age antecipadamente no processo de salvação do pecador por meio da Graça Preveniente (Sl 59.10; Jo 6.44, 15.16). É esta Graça o que capacita, prepara ou liberta o livre arbítrio do homem à escolha da salvação.

Por Cristo,

Itard Víctor



[1] As Obras de Armínio. Vol 2. P. 406. CPAD, 2015.

[2] Op. Cit. Vol 1. p. 473.


Por que em (At 2:13) há o termo γλεύκους ?

 


                                                                                                               Επίστευσα, διὸ ἐλάλησα

                                                                                                                    Cri, por isso falei 

 

 

Bem, o termo γλεύκους significa um vinho doce, um vinho novo, um suco de uvas não fermentado, de acordo com o TDNT, EDNT, Liddel-Scott, Louw-Nida, Thayer, Friberg, Gingrich. Em Flávio Josefo, o termo γλεύκους foi aplicado após a narrativa da colheita e do espremer imediato de três cachos de uvas em um copo (Ant 2:64).

Por que então Lucas fez uso desse termo em um contexto o qual envolve um deboche, por parte dos descrentes presentes no Pentecostes, relacionado à embriaguez? Porque, γλεύκους, quando colocado num recipiente fechado fermentava. E isto parece concordar com o que estava na mente do tradutor da LXX quanto este trabalhou no texto de (Jó 32.19), haja vista haver a expressão, γλεύκους ζέων, isto é, suco ou vinho fermentado. Jó estava ansioso ou empolgado para se expressar, por isto estava a ponto de não aguentar mais conter as palavras.

 

Por cristo,

Itard Víctor

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Ir ao médico é falta de Fé?



                                                                                  Επίστευσα, διὸ ἐλάλησα

                                                                                     Cri, por isso falei

 

“Itard, creio na evidência dos dons, principalmente no de operação de maravilhas. Mas, se eu procurar um médico pra me tratar, estou sem fé?”

Não descarto em hipótese algum a ação divina sobre as enfermidades. Além da experiência vejo isto nas Escrituras, por exemplo, a mulher curada do fluxo de sangue (Marcos 5.25-34). Segundo a minha esposa, que atua na área da saúde, um provável Mioma foi o causador do sangramento contínuo, haja vista esta doença pode gerar o mesmo sintoma e ser bastante comum nas mulheres.

Bem, no Evangelho de Marcos lemos relatos de algumas curas miraculosas da parte do Senhor Jesus. Porém, é também neste Evangelho que Jesus, Médico dos médicos, diz: “os doentes precisam de médico” (Mc 2.17). Isto é, apesar do contexto da Sua fala tratar de salvação, Ele usou, sem invalidar, a profissão de médico como exemplo. Além disso, arrisco dizer que Lucas, o médico amado (Cl 4.14), por ser íntimo de Paulo, passou alguns conhecimentos de medicina a Paulo, pois, este, prescreveu um remédio ao crente Timóteo o qual sofria de muitos de dores estomacais (1Tm 5.23), talvez causadas por uma gastrite, um refluxo ou até mesmo por uma doença psicossomática, por exemplo, a Ansiedade Patológica. Portanto, não é nem será falta de fé procurar recursos disponíveis pela medicina para se tratar duma enfermidade, principalmente depois de orar a Deus e este não responder com cura, pois pode não ser este o meio pelo o qual Ele quer responder à oração feita, ainda que com sinceridade (1Jo 5.14). É oportuno salientar algo: embora Deus possa não curar alguém seja por miraculoso seja por meio clínico, o objetivo primário de Deus não é curar as doenças dos doentes, mas os doentes das doenças com salvação e vida eterna (Jo 3:16; 1Jo 2.25).

Por Cristo,

Itard Víctor